Por Julia de Baére e Cristina Neves da Silva
A OAB foi criada em 18 de novembro de 1930 por meio do Decreto no 19.408 com o propósito de fiscalizar, disciplinar e selecionar advogados. Com a edição da Lei n.o 8.906/1994, as funções do órgão se tornaram mais amplas, como o dever de zelar pelos cidadãos e seus direitos perante a justiça, o que deu ao órgão grande relevância na sociedade. Atualmente a OAB é a maior e mais importante organização da sociedade civil no Brasil.
No entanto, apesar do importante papel social desempenhado, a OAB ainda enfrenta grandes desafios no que diz respeito à igualdade e representatividade. Isso porque as mulheres correspondem a 50% de inscritos na OAB, mas não conseguem alcançar igualdade de condições dentro do órgão de classe. Tal fato pode ser observado de forma bem emblemática em seu nome, que, ao invés de ser Ordem da Advocacia do Brasil, faz questão de enaltecer o gênero masculino – Ordem dos Advogados do Brasil.
As mulheres ainda enfrentam dificuldades para chegar aos cargos de chefia nos escritórios, são minoria em congressos e eventos jurídicos como palestrantes, são assediadas, bem como carecem de políticas institucionais para exercer a maternidade, o que dificulta o crescimento e a visibilidade profissional.
Chama atenção a triste realidade de que o órgão existe há 91 anos e nunca teve uma mulher no comando da OAB Federal e, em 27 seccionais, mais da metade nunca elegeu mulheres como presidente.
O cenário foi um pouco mais positivo nas recentes eleições de 2021 [1] que elegeram mulheres para conduzir as seccionais dos Estados da Bahia, Mato Grosso, Paraná, Santa Catarina e São Paulo. Desses Esta- dos, apenas Mato Grosso já havia elegido uma mulher para presidir a sua seccional, nos demais é um fato inédito. Des- taque para São Paulo, maior seccional do país, que além de ter elegido pela primeira vez uma mulher para a presidência, também terá uma mulher trans como conselheira. Outro fato interessante foi a eleição da seccional baiana onde foram eleitas mulheres para presidência e vice-presidência.
Esse avanço aponta para o acerto da política de paridade de gênero e das cotas raciais implementadas pelo Conselho Federal da OAB, já que o triênio gestor de 2019-2021 não contou com a participação de nenhuma mulher como presidente de seccional. A exigência da paridade busca romper a perpetuação do machismo e corrigir uma distorção histórica da entidade, diversificando e democratizando a OAB.
O avanço deve ser celebrado, mas o número de mulheres ainda é extremamente baixo, pois das 27 seccionais, apenas cinco serão lideradas por mulheres. Ademais, as seccionais do Acre, Amapá, Ceará, Espírito Santo, Goiás, Maranhão, Minas Gerais, Pernambuco, Rio de Janeiro, Rondônia nunca ele- geram mulheres como presidente [2], o que demonstra uma exclusão sistêmica de mulheres na direção do nosso órgão.
Vale lembrar que neste ano foi editada a Lei n.o 14.192, que estabelece as normas para prevenir, reprimir e combater a violência política de gênero e na qual o parágrafo único do artigo 3o estabelece que “constituem igualmente atos de violência política contra a mulher qual- quer distinção, exclusão ou restrição no reconhecimento, gozo ou exercício de seus direitos e de suas liberdades políticas fundamentais, em virtude do sexo”.
A sistemática exclusão de mulheres na chefia das seccionais e do Conselho Federal configura violência institucional, o que exige a atenção da advocacia a fim de garantir a plena legitimidade das mulheres advogadas em seu órgão de classe.
É importante e urgente a efetiva participação feminina na elaboração das políticas volta- das ao exercício da profissão, com o efetivo atendimento a demandas femininas e, acima de tudo, o respeito às nossas vozes e distintas realidades, sendo certo que a participação das mulheres no cenário institucional é indispensável para a real transformação da advocacia, tornando-a mais diversa e inclusiva.
[1] Até o envio do presente artigo RR ainda não havia finalizado o seu pleito.
[2] Não conseguimos apurar as antigas composições dos seguintes Estados: Paraíba, Roraima, Sergipe e Tocantins.
Artigo publicado na revista Data Venia.