Por Wald, Antunes, Vita e Blattner Advogados
Publicado no Valor Econômico
Mercado de créditos de carbono busca amadurecer para evitar riscos
O crescimento vertiginoso do mercado voluntário de créditos de carbono acabou por expor inconsistências envolvendo projetos, principalmente aqueles que tratam de preservação de florestas ou reflorestamento. Os percalços vão, especialmente, pela questão fundiária, e vão desde a inclusão de áreas públicas em seu escopo, o que não é permitido, passam por falhas na coleta de dados primários sobre o território e chegam à falta de informações precisas do projeto de impacto para as comunidades afetadas.
“A demanda cresceu mais rápido do que a capacidade do mercado de entregar”, diz Artur Ferreira, sócio fundador da Global Forest Bond (GFB), dando voz a uma observação recorrente no setor. Em consequência, o mercado busca o amadurecimento e grandes corporações passaram a ser mais exigentes nos projetos e participam inclusive de seu desenvolvimento, ao mesmo tempo em que surgem novas ferramentas com o objetivo de dar mais confiabilidade às due diligences. Neste caso estão o sistema de monitoramento digital, reporte e verificação para avaliar áreas com potencial de créditos de carbono desenvolvido pela climatech Moss, ou a digitalização da coleta de dados primários passíveis de serem auditados desenvolvida em parceria pela KPMG e a GFB, que integra biomas na economia, atraindo investimentos para unidades de conservação.
No caminho do amadurecimento, nem mesmo a maior certificadora de projetos, a Verra, escapou de críticas. De acordo com matéria publicada pelo jornal inglês The Guardian, a maior parte dos projetos envolvendo florestas por ela certificados não estariam contribuindo para os esforços de redução do carbono. A empresa negou as acusações, alegou que as principais críticas às metodologias citadas já são alvo de uma revisão que está em andamento desde 2021. “As múltiplas metodologias usadas atualmente para evitar projetos de desmatamento não planejado estão sendo consolidadas e uma abordagem de alocação jurisdicional está sendo adotada. Enquanto isso, as linhas de base do projeto agora são reavaliadas a cada seis anos, em vez de dez”, informou a empresa à publicação.
“A meu ver, vamos conseguir resolver o problema muito mais pela própria responsabilidade das empresas, porque os danos à imagem podem ser maiores do que outros danos”, diz Patrícia Iglecias, professora de direito da USP, ex-presidente da Cetesb e sócia responsável pela área ambiental do Wald, Antunes, Vita e Blattner Advogados. Para ela, o setor vai acabar se regulando. “A preocupação das empresas é evitar o greenwashing, o que é muito sério para a imagem delas.”
Segundo a Future Carbon, que atua no desenvolvimento de projetos, o mercado dobrou de tamanho de 2021 para 2022, passando de US$ 1 bilhão para US$ 2 bilhões. Estudo da consultoria McKinsey projeta que ele possa atingir US$ 15 bilhões em 2030 e US$ 35 bilhões em 2040. Ela sustenta que o Brasil concentra em seu território cerca de 15% das soluções climáticas naturais potenciais para abater ou sequestrar carbono da atmosfera, sendo o país com o maior potencial do mundo nessa área.
“Tais soluções envolvem a preservação e restauração de biomas e melhor captura de carbono no solo pela agricultura, iniciativas que podem ser estruturadas por meio de créditos voluntários de carbono”, cita o relatório. O Brasil emite 2 bilhões de toneladas de gás carbônico (CO2) por ano, sendo que 1,2 bilhão vem da queima de árvores. Além do CO2, a queima da madeira também libera metano, outro gás de efeito estufa (GEE). Reduzir essas emissões com a preservação de florestas, aliando-se a isso projetos de impacto socioambiental, traz ganhos para proprietários e comunidades. Programas desse tipo, e tambem com alta integridade, são os mais valorizados do mercado. A cada tonelada (t) de carbono que se evita chegar à atmosfera cria-se um crédito, que pode ter preços de US$ 10/t e chegar a US$ 15, em projetos novos premium, segundo Felipe Viana, diretor comercial da Carbonext
“Diz-se que o Brasil é a Arábia Saudita do crédito de carbono, porque quando se conserva uma floresta, há um crédito de carbono específico para isso. E temos um enorme potencial, por possuímos quase metade das florestas tropicais do mundo, isso significa que temos quase metade do potencial de gerar crédito de carbono de conservação”, afirma Luis Felipe Adaime, fundador e CEO da Moss.
Por trás da busca voraz pelos créditos está o Acordo de Paris, em que governos e organizações se comprometem a adotar medidas para reduzir as emissões de GEE. Com muitas companhias tendo mais dificuldades para fazer a redução, elas recorrem ao mercado voluntário para compensar sua poluição. Para se ter uma ideia do que está em jogo, somente o Santander – que já teve seu nome envolvido em um projeto que posteriormente foi acusado de irregularidades – adotou o compromisso de se tornar net zero até 2050 nos escopos 1, 2 e 3 – que inclui fornecedores e clientes. E nesse sentido, os créditos são uma das ações necessárias para que o banco consiga cumprir suas metas e também oferecer esses créditos para clientes.
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